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sábado, 31 de julho de 2010

Vídeo Magia

Contra todos os argumentos dos amigos e parentes, contra todos os prognósticos do mercado e, talvez, contra sua própria razão, ele abriu uma vídeo locadora. E, como se não fosse o suficiente, resolveu que só alugaria fitas VHS. O nome era ‘Vídeo Magia 90’, o número remetendo à década. Só ele trabalhava na loja, que tinha apenas dois cômodos. Começava com uma pequena recepção, com balcão, uma estufa de salgados e uma TV de um metro e meio cúbico abaixo de um vídeo cassete de oito cabeças. Pôsteres preenchiam cada pedaço da parede.

Continuava em um salão com uma pequena janela, onde o acervo ficava exposto. Prateleiras pretas com 2 metros de altura preenchiam todas as paredes e riscavam quatro vezes o centro, formando corredores estreitos com um ar sombrio, quebrado apenas pela cortina vermelha, ao fundo, que delimitava os ‘filmes adultos’.

A inauguração despertou algum interesse da mídia local e gerou um pequeno movimento. As pessoas entravam e admiravam as caixas das fitas como se fossem objetos advindos do século XIX. Contudo, algumas pessoas liberavam um sorriso compulsório quando vislumbravam um velho conhecido. E eles estavam todos lá: Harry e Sally, Hannibal Lector, Mr. Udall, Willian Wallace, Forrest Gump, Jerry Maguire, Linkavich Chamovisk e tantos outros. Não que eles não estivessem disponíveis em outras mídias, mas aqueles ali eram os originais, os próprios, os que eles haviam reservado para o sábado, assistido três vezes - porque não teriam a chance de ver de novo tão cedo - e esquecido de rebobinar. As lembranças, precocemente longínquas, de uma coisa tão recente e arcaica, causavam um sentimento de conforto e segurança, como no final de um filme de ‘volta pra casa’.

Em algumas semanas a locadora estava entregue à poeira e o seu único cliente era seu próprio dono, que comia os salgados e assistia a filmes o tempo todo. Não obstante, ele a manteve aberta, consumindo seu patrimônio.

Entretanto, às vezes alguém entrava ali, por curiosidade, e se dirigia à sessão de aventura notando que havia uma cópia de Jurassic Park II, com a caixa imitando rocha fossilizada. Segurava o receptáculo como quem segura um espelho e sorria ternamente. Olhava a sua volta buscando tempos idos e encontrava apenas um único olhar cúmplice, que aquiescia com a cabeça.

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