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domingo, 29 de julho de 2012

Os 800 mil ou Meu Veríssimo Preferido

Tempos atrás achei num sebo um pequeno livro com uma coletânea de textos e charges sobre o governo de Fernando Collor, produzidos por três grandes autores brasileiros, Jô Soares, Millôr Fernandes e Luis Fernando Veríssimo. O nome era genial: Humor nos tempo do Collor.

Entre os trabalhos de Veríssimo estava uma pequena crônica chamada "Os 800 mil". Dotado de uma fina ironia, ela expunha toda a demagogia das declarações de Mário Amato, presidente da Fiesp na época, que afirmou que 800 mil industriais deixariam o país caso Lula chegasse a presidência em 89. Para fechar, uma perspicaz tirinha completando o adágio que diz que todo brasileiro é corrupto.

A crônica ficou na minha cabeça. Dia desses tive vontade de ler novamente, procurei na internet e não achei em lugar nenhum. Como é possível não ter um texto do Veríssimo da internet? Até os de outras pessoas levam o seu nome! Tomei a liberdade de transcrever e agora publico aqui, pra compartilhar com as 3 pessoas que leem esse blog...


Os 800 mil
 por Luis Fernando Veríssimo


            Os 800 mil industriais que, segundo Mario Amato, sairão do País se a esquerda vencer as eleições devem se precaver – pois do jeito que vai qualquer coisa pode acontecer no dia 15 de novembro – e ir preparando o seu êxodo. Ele deve ser organizado, e em vez de cada um pegar a família e as trouxas e rumar para o consulado mais próximo os 800 mil podiam se cotizar e comprar uma área, por exemplo, no meio-oeste dos Estados Unidos, onde fundariam a cidade de Brasileira, que com mais de três milhões de habitantes (supondo-se que cada industrial leve em média quatro dependente) e 800 mil indústrias já começaria a vida como um dos mais fortes pólos econômicos da América. Brasileira seria o Brasil dos sonhos dos 800 mil industriais do Amato. Ou seja, o Brasil sem o PT, sem a CUT, sem o nosso atraso e os nosso políticos – e com o dólar legal. É verdade que os 800 mil industriais encontrariam algumas dificuldades. Não conseguiriam mão-de-obra adequada, com os sindicatos americanos em questões como salubridade e segurança nos locais de trabalho. Suas margens de lucro teriam que ser reguladas pela perspectiva média do mercado, não pelo máximo suportável, sempre uma reciclagem dolorosa. Sua tendência para a formação de cartéis informais e alguns dos seus hábitos contábeis seriam reprovados pelo governo americano. Em pouco tempo bateria a saudade – ah o sol, o samba, o over – e não demoraria muito para que alguém propusesse um êxodo de volta. A esquerda no poder, à distância, não pareceria tão ruim. Voltariam todos.
            E, na chegada, um porta-voz daria as razões do retorno.
            - Sei lá. Não nos adaptamos ao capitalismo. 



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